“(...) É SÓ
COMEÇAR”
“No porão e no sótão, as tralhas viram sobrecarga. Na entrada,
restringem o fluxo da vida. Empilhadas no chão, nos puxam para baixo. Acima de
nós, são dores de cabeça. Sob a cama, poluem o sono”.Luiz Augusto Gonçalves Barbosa
Não queria me desfazer deles. Mas não tinha motivos para
continuar a tê-los. O tempo veloz os tornou desatualizados. A falta de espaço
era outro motivo para me desvencilhar. Fiz então a pequena pilha colocada
propositadamente perto da porta. Quando eu fosse sair, levaria aqueles livros
para o lixo, cerca de dez ou doze.
A semana passou e a pilha continuava ali. Embora não
agisse, a intenção de desfazer se mantinha. Era o certo. Incerta era minha
omissão.
Lembrava deles ao sair ou no retorno. Tinha um exemplar
que ganhei do autor quando eu morava em Curitiba. O livro continha tantos erros
e escasso conteúdo que foi penoso ler.
Não foi sonho nem devaneio. Nada sobrenatural,
simplesmente levanto na madrugada com grande calor e olho pela janela, o luar
instigante como eco do silêncio em tudo.
Visto-me. Uma roupa simples qualquer (todas elas são
simples, com ou sem seus quaisqueres). Caminho quadra dali, acolá. Sem supor
que alguém perceba a minha existência, aleatoriamente fui lançando aqueles
livros em jardins, calçadas internas, garagens. Antes havia arrancado as folhas
que contivessem identificação do então dono.
Foi só gesto insano/sadio de alguém que resolveu
transferir para outrem, desconhecido, a incumbência de se desfazer do que eu
próprio não me livrara diretamente.
Lembrei-me daquela noite ao assistir a propaganda na
televisão sobre a página eletrônica de classificados gratuitos veiculada
atualmente (a empresa OLX tem sede em Nova Iorque). É criativa, hilária:
“desapegar é só começar”, e tem vários exemplos de objetos com a cabeça de
gente conhecida tentando fazer com que a consciência pese, até que alguém bota
tudo à venda, faz bom negócio instantaneamente.
Talvez se eu fosse oferecer os livros da pilha, seria presente
de grego, a boa educação seria incapaz de fazer alguém aceitar. Livros
velhos como eu. Eu que não me dou por saber que não seria aceito. Livros não
têm idade nem vida quando não lidos e são solenemente ignorados. É uma pilha o texto de hoje. Eu a pilhar.
Fases de Fazer Frases (I)
Ouça a voz da razão, ainda
que muda.
Fases de Fazer Frases (II)
Dar o que não tem a quem não precisa, gentileza
fútil.
Fases de Fazer Frases (III)
Verdades não se prestam a esconder mentiras.
Mentiras tentam esconderijo nas verdades.
Fases de Fazer Frases (IV)
Uma ideia poderá se apresentar pelo contrário.
Poderá o contrário uma ideia se apresentar.
Olhos, Vistos do Cotidiano
(I)
Não dá para negar, o deputado federal Zeca Dirceu (PT)
agiu rápido, ao demitir a assessora dele Lucy Mary Silvestre Esteve. Ela foi
presa ao tentar liberar uma verba judicial na Caixa Econômica, contendo a
assinatura falsa do juiz. O gerente desconfiou e ela foi presa em flagrante.
Ela já responde a outro golpe, quando conseguiu sacar o dinheiro.
O Zeca é a segunda vez que tem gente da equipe dele
envolvido com a Justiça. O ex-vereador de Umuarama José Cícero Laurentino foi
preso anos atrás por não pagar pensão.
Se pode ser estranha coincidência, o fato é que o
deputado petista não sabe escolher quem trabalha com ele, e fica difícil todo
mundo crer que seja capaz de exercer uma das funções primordiais do parlamento,
fiscalizar.
Ele é filho do deputado cassado José Dirceu condenado e
preso por causa do mensalão. O filho dele poderia propor à Justiça que o
pai trabalhasse no gabinete petista, seria o terceiro “enrolado” com a Justiça,
ou melhor, neste caso, condenado em definitivo.
Olhos, Vistos do Cotidiano
(II)
Por falar em deputado federal (ex- PT), outro paranaense,
André Vargas começa a agudizar na agonia do ostracismo. Êta vida dura dos
amigos e dos doleiros!
Reminiscências em Preto e
Branco
Noites frias, a cidade silencia mais cedo.
Pessoas se recolhem. Acolhem. Se encolhem. O vento que cala o frio. Calafrio.
Pingos, gotas, chuva. A imagem da lua espelhada na poça d'água que não tardará
desaparecer quando o sol vier. A quietude é tão negra como a escuridão da
noite. “A calada da noite” não sai de casa, para ela voltou antes de atrair o
sussurro que trai.
José Eugênio Maciel é mourãoense, filho de pioneiros, professor, sociólogo, advogado, membro da Academia Mourãoense de Letras e do Centro de Letras do Paraná.
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