A METADE COMO SE
FOSSE
(QUASE) TUDO
“A palavra é
metade de quem a pronuncia e metade de que a escuta”
Montaigne
A
Coluna de hoje alcança o 25º ano de publicação. O sentimento maior é a gratidão
ao caro leitor e ao Jornal, sem os quais o dia 10 de julho de 1988 não teria
existido, trajetória percorrida até hoje. Voltar ao tempo pelas reminiscências
é oportuno, examinar o caminho percorrido.
A
metade de 50 é 25 e diz respeito à condição pessoal deste colunista: tenho 50
anos de vida, a metade da minha existência tem sido escrever esta Coluna. São
metades representadas nos 1798 Artigos publicados: metade representada
inclusive pela relação com o Jornal. Quando comecei a escrever aqui, então com
25 anos, a Tribuna do Interior iria completar, naquele 1988, 20 anos de
existência. Ela começou a circular no dia do aniversário de Campo Mourão, 10 de
outubro de 1968. Fatos que reunidos representam quase uma metade. À
época, o Jornal era editado apenas aos domingos, parece inacreditável quando se
pensa nos dias atuais, mas era a realidade rudimentar em termos de impressão.
Jamais
estabeleci qualquer meta, tracei algum plano ou vislumbrei uma marca. Confesso,
de algum modo estou surpreso ao atingir 25 anos e logo mais a marca de 1800
publicações. O único objetivo tem prazo fixado, escrever para o domingo seguinte. Cuido de subir cada
degrau por vez, sem saber o tamanho da escada, quando muito cada lance, sempre
a partir dos pés que se alternam entre um degrau e outro, a exigir, ora que
apenas um dos pés fique num degrau e o outro seja lançado ao mais alto
seguinte, ora ambos ficam por um tempo no mesmo degrau.
Cada domingo é um degrau. Na altura em
que me encontro na escada eu olho para trás, para baixo e vejo os primeiros
degraus já bem afastados de mim, talvez eu não esteja vendo-os precisamente,
pode ser que é contemplativa a imaginação feita memória a descortinar o começo
da escada. Três momentos evidenciam o quanto aqueles primeiros degraus foram
decisivos, sem os quais não chegaria até aqui, eles até parecem poucos diante
da subida, compreendida não como glória, mas a elevação da responsabilidade em
poder corresponder minimamente à expectativa do leitor.
Marcas que
agora retornam brevemente. A primeira referência feita foi quando esta Coluna
registrou a centésima vez, em 1992, 17 de março. Citei o escritor Mário da
Silva, “Cada escritor tem os leitores que merece”. O centésimo Artigo,
intitulado Esta coluna, pela centésima
vez, a certa altura do texto afirmei “não se sabe precisamente quantas
virão. Existe uma certeza ao menos, o desafio de escrever, e olha que aqui já
há certa presunção do articulista ao julgar que ele realmente escreve, no
sentido correto do termo”. Em 1994 era publicado o trecentésimo texto, Tudo se pode escrever. Jamais se poderá escrever
tudo, era 15 de julho, “razão e emoção caracterizam o escrever. É bem
verdade que misturá-las convenientemente não é muito fácil, pois ora a razão
prepondera, por vezes a emoção guia determinantemente o texto. O mais
importante sempre é procurar fazer com que ambos os aspectos sejam levados em
conta ao escrever”. Por fim rememoro o 24 de março de 1996, a Coluna atinge
seiscentas vezes, intitulada Ela não tem
dono nem é absoluta. O ela em
questão se referia a verdade: “nunca deixa de ser enquanto tal, pois ela evolui
de acordo com o contínuo conhecimento dos homens, a descoberta de si mesmo
lança sempre novas luzes, as quais com os seus raios fazem com que eles
enxerguem a verdade como outrora não conseguiam”. Pois é, veio à milésima e
chegou também a de n° 1500 (manchete na primeira página deste Jornal) ... Mas
tudo tem a ver com cada domingo, cada degrau.
Exatamente
em 1988 o Brasil vivenciava o processo constituinte, a Assembleia eleita para
tal finalidade concluiu os trabalho e a oitava Constituição Federal foi
promulgada em outubro daquele ano. Vale ressaltar o fim dos 21 anos de ditadura
militar e também termos ainda um presidente eleito indiretamente, embora civil.
Tancredo Neves foi escolhido pelo colégio eleitoral e afirmou que seria o último
presidente a ocupar tal cargo pela via indireta. Ele não chegou a tomar posse,
morreu por complicações de doença. O vice José Sarney assume e termina o
mandato.
Os
25 anos descortinam a recordação como eram os meios de comunicação para
transmitir os textos jornalísticos ou a notícia ainda “bruta”, era o telex, através
de uma fita de papel perfurada mecanicamente escrita com todas as letras
maiúsculas, texto transmitido com muito barulho no momento em que elas
operavam. Foi assim também que o texto da coluna chegava à redação do Jornal.
Depois veio o fax, transmitido em telecópia, que funcionou até o início do ano
2000, quando surge a rede mundial de computadores.
Pessoal
e profissionalmente, o “escrevinhador” aqui passou por mudanças, de cargos,
funções e atuação profissional, a merecer o registro em outra oportunidade.
Perdi muitos leitores em razão da morte deles, inclusive tendo retratado aqui
biograficamente. Perdi primeiro o meu pai Eloy, que se foi em 1995, junho, e
também em junho, no 2011, o derradeiro adeus a mãe Elza.
Metade
da minha vida a escrever para a Tribuna, e buscar na metade da
existência dela o ponto de equilíbrio cronológico e o equilíbrio a fundamentar
os textos, ser livre para escrever e escrever com liberdade. Obrigado!
Frases de Fazer Frases
Metade, parte metáfora, parte que não se mete fora.
Metades que fazem o inteiro.
Olhos, Vistos do Cotidiano
É
preciso de novo chamar a atenção. O Ministério da Educação voltou com a
publicidade na qual a locutora conclama os jovens à participação, “... para
fazer planos para o futuro”. Não existem planos para o passado! O ministério
deseduca.
Reminiscências em Preto e
Branco
A
redação de um jornal é como se fosse a cozinha de restaurante. O freguês
escolhe as opções do cardápio. É comum não se ter noção como funciona a
cozinha. O cardápio do jornal é as seções. Há 25 anos esta Coluna é
opção, sem saber se é “à moda da casa”. José Eugênio Maciel, mourãoense, professor, sociólogo, advogado e membro da Academia Mourãoense de Letras e do Centro de Letras do Paraná.
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