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29 de ago. de 2011
COLUNA DA PROFª MARIA JOANA: “Caí no mundo e não sei como voltar"
Com este texto do escritor uruguaio Eduardo Galeano, entendi muito as minhas angústias. Como ele também não consigo andar pelo mundo pegando coisas e trocando-as pelo modelo seguinte só por que alguém adicionou uma nova função ou a diminuiu um pouco… “À nossa geração sempre foi difícil jogar fora. Nem os defeituosos conseguíamos descartar! E, assim, andamos pelas ruas, guardando o muco no lenço de tecido, de bolso. Também não consigo trocar os instrumentos musicais uma vez por ano, o celular a cada três meses ou o monitor do computador por todas as novidades. Guardo os copos descartáveis! Lavo as luvas de látex que eram para usar uma só vez. Venho de um tempo em que as coisas eram compradas para toda a vida! Se compravam para a vida dos que vinham depois! A gente herdava relógios de parede, jogos de copas, vasilhas e até bacias de louça. E acontece que em nosso matrimônio, tivemos mais cozinhas do que as que havia em todo o bairro em minha infância, e trocamos de refrigerador várias vezes. Tudo se lasca, se gasta, se oxida, se quebra ou se consome em pouco tempo para que possamos trocar. Nada se arruma. O obsoleto é de fábrica “Tudo se joga fora, tudo se descarta e, entretanto, produzimos mais e mais e mais lixo. Se produziu mais lixo nos últimos 40 anos que em toda a história da humanidade”.
Quem tem menos de 30 anos não vai acreditar: como ele, quando eu era pequeno, pela minha casa não passava o caminhão que recolhe o lixo! Todos os descartáveis eram orgânicos e iam parar no galinheiro. Não existia o plástico, nem o nylon. A borracha só víamos nas rodas dos autos e, as que não estavam rodando, as queimávamos na Festa de São João, viravam balança para as crianças... Os poucos descartáveis que não eram comidos pelos animais, serviam de adubo ou se queimava. Desse tempo venho eu. E não que tenha sido melhor... É que não é fácil para uma pobre pessoa, que educaram com "guarde e guarde que alguma vez pode servir para alguma coisa", mudar para o "compre e jogue fora que já vem um novo modelo".
Troca-se de carro a cada três anos, no máximo, por que, caso contrário, és um pobretão. Ainda que o carro que tenhas esteja em bom estado... E precisamos viver endividados, eternamente, para pagar o novo!!! Mas... por amor de Deus!
“Minha cabeça não resiste tanto. Agora, meus parentes e os filhos de meus amigos não só trocam de celular uma vez por semana, como, além disto, trocam o número, o endereço eletrônico e, até, o endereço real. Como querem que entenda a essa gente que se descarta de seu celular a poucos meses de o comprar? Será que quando as coisas são conseguidas tão facilmente, não se valorizam e se tornam descartáveis com a mesma facilidade com que foram conseguidas? E a mim que me prepararam para viver com o mesmo número, o mesmo marido e o mesmo nome. Me educaram para guardar tudo. Tuuuudo! O que servia e o que não servia. Por que, algum dia, as coisas poderiam voltar a servir. Acreditávamos em tudo. Sim, já sei, tivemos um grande problema: nunca nos explicaram que coisas poderiam servir e que coisas não. E no afã de guardar (por que éramos de acreditar), guardávamos até o umbigo de nosso primeiro filho, o dente do segundo, os cadernos do jardim de infância...” “Eu sei o que nos acontecia: nos custava muito declarar a morte de nossos objetos.”
“Morro por dizer que hoje não só os eletrodomésticos são descartáveis; também o matrimônio e até a amizade são descartáveis. Mas não cometerei a imprudência de comparar objetos com pessoas. Me mordo para não falar da identidade que se vai perdendo, da memória coletiva que se vai descartando, do passado efêmero. Não vou fazer. Não vou misturar os temas, não vou dizer que ao eterno tornaram caduco e ao caduco fizeram eterno. Não vou dizer que aos velhos se declara a morte apenas começam a falhar em suas funções, que aos cônjuges se trocam por modelos mais novos, que as pessoas a que lhes falta alguma função se discrimina o que se valoriza aos mais bonitos, com brilhos, com brilhantina no cabelo e glamour”.
“Nããão! Eu não digo que isto era melhor. O que digo é que, em algum momento, me distraí, caí do mundo e, agora, não sei por onde se volta”.
Maria Joana Titton Calderari – membro da Academia Mourãoense de Letras, graduada Letras UFPR, especialização Filosofia-FECILCAM e Ensino Religioso-PUC-majocalderari@yahoo.com.br
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