22 de abr. de 2014

COLUNA DO MACIEL: Marquez, a palavra morre, não a escrita

Te amo não por quem tu és, mas por quem sou quando estou contigo” Gabriel García Márquez
            Contar histórias é a palavra-chave com relação a Gabriel García Márquez, morto na última quinta-feira, 17. O fabuloso conteúdo das lendas passou a fazer parte do cotidiano do menino nascido na colombiana cidade de Aracataca. A avó paterna lhe contava histórias encenadas, o prazer dela se fundia sempre nos olhos ávidos e felizes do Gabriel, fascinado por ver descortinar acontecimentos ricos em aventuras e, por mais que fossem bem descritas as situações, ele se encarregava de descortinar em si mesmo o mundo da imaginação criadora, telúrica.
            Ao lhe contar histórias e viver no mundo narrativo, o caminho apontado pelo destino familiar foi a base e inspiração para que o escritor desse os primeiros passos e não mais parasse de escrever, contar histórias. Apesar da morte aos 87 anos, os livros ficam e estarão à disposição por se constituírem na mais cabal comprovação do talento literário de um escritor universal, que assim se tornou por engendrar textualmente a universalidade do romance, da novela, do todo conteúdo apurado, belo, instigante.
            A repercussão da morte dele, mesmo a considerar os problemas devido à combalida saúde e o avançar dos anos, não deixou de ter enorme impacto. Convém salientar, com a morte de Gabriel não foi preciso, em momento algum, que o mundo pudesse, a partir da própria perda, vir a conhecer a obra e a vida de um célebre escritor. Gabriel em vida se tornou sucesso, respeitado, admirado em todo mundo, e para nós latino-americanos uma especial honra, incontido e justo orgulho. Em 1982, ao receber o Prêmio Nobel da Literatura, a escolha dele já era esperada e mais cedo ou mais tarde seria mais um reconhecimento da sua importância.
            Escrito em 1967, Cem anos de solidão é obra-prima – não dele apenas – é clássico da literatura mundial, romance vigoroso, rico no número de personagens e tramas, e desde o lançamento mantém o crescente número de leitores e os que prazerosamente relêem, espelha a tradução ininterrupta em todas as línguas, com vendagens sempre crescentes. Os demais romances compuseram a base da sua obra, o realismo fantástico, “a figura mais importante neste estilo”, segundo o poeta Ferreira Gullar. O outono do patriarca (1975), O amor nos tempos do cólera (1981), Crônica de uma morte anunciada (1982), O general eu seu labirinto (1989) e Do amor e outros demônios (1994) são representativos que bem compõem a capacidade invulgar de contar história, do envolver do tempo vivido, observado, inventado que ele compunha e a envolver os  sempre fascinados leitores.
            “Não é verdade que as pessoas param de perseguir os sonhos porque elas envelhecem, elas envelhecem porque param de perseguir sonhos”, declarou o grande literato, sintetizando a uma só condição, a de homem e a do escritor com seus personagens. E, como bom místico, que só crê no que vê sem necessariamente duvidar do que não viu, afirmou: “Não acredito em Deus, mas tenho medo dele”.
Fases de Fazer Frases (I)
            Quando nada se espera nela brota a surpresa.
Fases de Fazer Frases (II)
            Espero minha chegada para não ficar só comigo.
Fases de Fazer Frases (III)
            Chego até mim para buscar abrigo no que fui.
Olhos, Vistos do Cotidiano
            Um andarilho me pede um cigarro, “não fumo” e logo ele me responde, “mas como?! Todo mundo fuma?!” Sigo a caminhada no feriado da última sexta e ele pensa em voz alta, “esta cara um dia já fumou sim!”
            Só faltava eu entrar num bar e passar a comprar cigarro. Embora não esteja absolutamente pretendendo fumar, (nunca fumei nem tive vontade), seria só para dar um cigarro quando alguém me pedisse. Também teria que andar com um litro de pinga.     
Reminiscências em Preto e Branco
            O som artificial é o que se ouve, pelos ouvidos. Passam as pessoas, a maioria delas com o fone de ouvido a escutar música como se estivessem em uma redoma a prova de todos os outros sons. Será que elas conseguem perceber as gargalhadas das crianças brincando no quintal? Identificar o canto de um pássaro? E a voz da mãe delas? Quem sabe (?) elas só reconheçam a voz própria, voz muda ou de repetição do som artificial que escutam sem perscrutar. José Eugênio Maciel, professor, sociólogo, advogado, escritor, membro da Academia Mourãoense de Letras e do Centro de Letras do Paraná.      

Nenhum comentário:

Postar um comentário